Ficando feliz por nada novamente...

Há períodos em nossas vidas nos quais não nos identificamos com absolutamente nada. E nesta fase, caro leitor, tudo costuma ser sem graça, pois não há nada que nos tire da mesmice de sempre e da rotina chata. Nestes tempos difíceis nenhum barzinho tem a coxinha que gostamos, nenhum livro é digno de nossa atenção na prateleira da livraria, nenhuma banda consegue criar uma nova canção que nos agrade, nenhum prato de comida se torna objeto de nosso desejo, nenhuma fotografia consegue nos emocionar, nenhum filme consegue entrar para a lista dos mais queridos, nenhum assunto é digno de se tornar uma crônica e – pasmem, sobretudo os seres do sexo feminino – nem as vitrines das lojas de sapatos e roupas em promoção de 80% conseguem nos entreter e nos fazer abrir as carteiras.

E quando isso acontece, a falta de identificação com algo complicado ou simples, ficamos mal humorados, chatos e repulsivos. Sim, chatos de galocha, daqueles que não queremos perto nem hoje e nem nunca, que não sorriem nem quando seus cachorros de estimação os recebem felizes e balançando o rabo igual corda de pular na velocidade “foguinho”. E eu estava assim, um ser totalmente insuportável, apático e que não conseguia se identificar com nada. Mas como diz meu sábio avô Cid, depois de toda borrasca sempre vem uma boa surpresa.

E meu avô realmente estava certo. Estava lá na ergométrica da academia, em uma noite fria de quinta-feira, lendo uma revista qualquer para me distrair durante o tempo de aquecimento para ir à musculação quando uma das professoras de lá, a Gi, veio em minha direção com um livro na mão, com um sorrisão no rosto – e ela está grávida, então era um lindo e grande sorriso mesmo – e me disse “Acho que você vai adorar este livro, é a sua cara!”. Entregou em minhas mãos o livro “Feliz por Nada”, com crônicas da Martha Medeiros.

Confesso que havia lido alguns textos da jornalista por aí, há muitos anos mesmo, e naquela época nem sabia o que era uma crônica. Anos mais tarde e completamente apaixonada por este gênero literário, tenho aproveitado cada frase da Martha. Ela tem tudo na dose certa, talento, simplicidade, objetividade, passa longe da autoajuda – ufa! – e sabe fazer o que eu sempre quis desde que resolvi fazer jornalismo: despertar, no ato, a identificação do leitor com o que eu sou capaz de escrever.

E pronto, nem preciso dizer que bastou algumas páginas para que eu pudesse sair finalmente da zona de conforto e da apatia, voltar a me identificar com algo, sensibilizar-me mais e voltar  a me inspirar. Uma delícia voltar à normalidade de se identificar com o próximo, mesmo não o conhecendo; de rir com coisas simples, de saber que todo mundo tem uma amiga com complexo de namorado, de também achar que nem tudo é digno de foto e de se sentir próxima da realidade, sem frescura e sem muitos adjetivos. Como é bom ficar feliz novamente e de forma mais fácil do que o esperado, com uma boa dica de leitura na esteira da academia...


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