Que saudades do Zin'Bar...
Comidinha e bebidinha mais que boa, mesinha ao ar livre, preço camarada, música no volume certo e excelente atendimento, é um dos únicos lugares que me sinto bem a vontade em Campinas, pois não tem frescura nenhuma e é de primeira (Rosane, vou pegar emprestada essa expressão, ok? rs).
Entretanto, meu botequinho querido está fechado há dois meses e juro que estou morrendo de saudades. Sei que não é definitivo e que estão de mudança para outro endereço, pois o shopping Jaraguá fechou, mas é difícil imaginar as noites de verão sem dar uma passadinha lá, para jogar conversa fora. Até brincam que vou ter que procurar ajuda profissional caso não volte a funcionar logo, pois adoro tudo lá.
Se tiver um tempinho não deixe de ler...
Bar ruim é lindo, bicho
de Antonio Prata
Eu sou meio intelectual, meio de esquerda, por isso freqüento bares meio ruins. Não sei se você sabe, mas nós, meio intelectuais, meio de esquerda, nos julgamos a vanguarda do proletariado, há mais de cento e cinqüenta anos. (Deve ter alguma coisa de errado com uma vanguarda de mais de cento e cinqüenta anos, mas tudo bem.)
No bar ruim que ando freqüentando ultimamente o proletariado atende por Betão – é o garçom, que cumprimento com um tapinha nas costas, acreditando resolver aí quinhentos anos de história.
Nós, meio intelectuais, meio de esquerda, adoramos ficar “amigos” do garçom, com quem falamos sobre futebol enquanto nossos amigos não chegam para falarmos de literatura.
– Ô Betão, traz mais uma pra a gente – eu digo, com os cotovelos apoiados na mesa bamba de lata, e me sinto parte dessa coisa linda que é o Brasil.
Nós, meio intelectuais, meio de esquerda, adoramos fazer parte dessa coisa linda que é o Brasil, por isso vamos a bares ruins, que têm mais a cara do Brasil que os bares bons, onde se serve petit gâteau e não tem frango à passarinho ou carne-de-sol com macaxeira, que são os pratos tradicionais da nossa cozinha. Se bem que nós, meio intelectuais, meio de esquerda, quando convidamos uma moça para sair pela primeira vez, atacamos mais de petit gâteau do que de frango à passarinho, porque a gente gosta do Brasil e tal, mas na hora do vamos ver uma europazinha bem que ajuda.
Nós, meio intelectuais, meio de esquerda, gostamos do Brasil, mas muito bem diagramado. Não é qualquer Brasil. Assim como não é qualquer bar ruim. Tem que ser um bar ruim autêntico, um boteco, com mesa de lata, copo americano e, se tiver porção de carne-de-sol, uma lágrima imediatamente desponta em nossos olhos, meio de canto, meio escondida. Quando um de nós, meio intelectual, meio de esquerda, descobre um novo bar ruim que nenhum outro meio intelectuais, meio de esquerda, freqüenta, não nos contemos: ligamos pra turma inteira de meio intelectuais, meio de esquerda e decretamos que aquele lá é o nosso novo bar ruim.
O problema é que aos poucos o bar ruim vai se tornando cult, vai sendo freqüentado por vários meio intelectuais, meio de esquerda e universitárias mais ou menos gostosas. Até que uma hora sai na Vejinha como ponto freqüentado por artistas, cineastas e universitários e, um belo dia, a gente chega no bar ruim e tá cheio de gente que não é nem meio intelectual nem meio de esquerda e foi lá para ver se tem mesmo artistas, cineastas e, principalmente, universitárias mais ou menos gostosas. Aí a gente diz: eu gostava disso aqui antes, quando só vinha a minha turma de meio intelectuais, meio de esquerda, as universitárias mais ou menos gostosas e uns velhos bêbados que jogavam dominó. Porque nós, meio intelectuais, meio de esquerda, adoramos dizer que freqüentávamos o bar antes de ele ficar famoso, íamos a tal praia antes de ela encher de gente, ouvíamos a banda antes de tocar na MTV. Nós gostamos dos pobres que estavam na praia antes, uns pobres que sabem subir em coqueiro e usam sandália de couro, isso a gente acha lindo, mas a gente detesta os pobres que chegam depois, de Chevette e chinelo Rider. Esse pobre não, a gente gosta do pobre autêntico, do Brasil autêntico. E a gente abomina a Vejinha, abomina mesmo, acima de tudo.
Os donos dos bares ruins que a gente freqüenta se dividem em dois tipos: os que entendem a gente e os que não entendem. Os que entendem percebem qual é a nossa, mantêm o bar autenticamente ruim, chamam uns primos do cunhado para tocar samba de roda toda sexta-feira, introduzem bolinho de bacalhau no cardápio e aumentam cinqüenta por cento o preço de tudo. (Eles sacam que nós, meio intelectuais, meio de esquerda, somos meio bem de vida e nos dispomos a pagar caro por aquilo que tem cara de barato.) Os donos que não entendem qual é a nossa, diante da invasão, trocam as mesas de lata por umas de fórmica imitando mármore, azulejam a parede e põem um som estéreo tocando reggae. Aí eles se dão mal, porque a gente odeia isso, a gente gosta, como já disse algumas vezes, é daquela coisa autêntica, tão Brasil, tão raiz.
Não pense que é fácil ser meio intelectual, meio de esquerda em nosso país. A cada dia está mais difícil encontrar bares ruins do jeito que a gente gosta, os pobres estão todos de chinelos Rider e a Vejinha sempre alerta, pronta para encher nossos bares ruins de gente jovem e bonita e a difundir o petit gâteau pelos quatro cantos do globo. Para desespero dos meio intelectuais, meio de esquerda que, como eu, por questões ideológicas, preferem frango à passarinho e carne-de-sol com macaxeira (que é a mesma coisa que mandioca, mas é como se diz lá no Nordeste, e nós, meio intelectuais, meio de esquerda, achamos que o Nordeste é muito mais autêntico que o Sudeste e preferimos esse termo, macaxeira, que é bem mais assim Câmara Cascudo, saca?).
– Ô Betão, vê uma cachaça aqui pra mim. De Salinas quais que tem?
Texto tirado do livro "As cem melhores crônicas brasileiras"
*Imagem de porta do banheiro masculino do Zin'Bar (quem conhece meu pai notará uma séria semelhança). Crédito da foto: Marília Piovesana e seu ágil celular!
Comentários
Eu também tenho o meu barzinho prá tomar café de manhä.
Êles sabem como eu gosto.
Espresso, bem forte e com azúcar moreno.
É uma especie de ritual.
Aqui na España ha muita costume os dias festivos de antes da hora lo almôço, que é mais tarde que no resto do mundo (sobre as 14 horas) de tomar o vermute.
Mas o nome näo têm nada que ver com essa bebida (tal vez antes, era muito elegante beber vermuth, e por isso ficoy com o nome)
Bon, cada um bebe o que mais gosta. Geralmente uma cervejinha ou um bom vinho (aqui há excelentes vinhos e uma cultura vinícola muito grande.
Tapa é um pratinho pequeno de distintas coisas, bem cozinhadas, fritas ou cruas, para acompañar.
Tambén se pode fazer antes de jantar.
Em veräo, en todo o litoral, ha costume de sentarse em mesinhas na rua prá tomar uma bebida como café gelado en uma taça con uma bola de sorvete de vainillha ou nata.
Ou Um bom irish coffe, etc.
Bom proveito!!!!
A crônica é saborosa; meu tipo de texto favorito, sem dúvida!
Tenho essa relação de amor com o Zin'Bar, da mesma forma que vc diz já ter tido com o Cacique Chá. Lá servem um bolinho de carne seca com mandioca imperdível, adoro! Se morasse em Campinas, com certeza lhe chamaria para a reabertura!
Um beijo,
Gabi.
Tenho que confessar que fiquei morrendo de vontade de experimentar todas essas coisinhas que me disse, me parece "muy sobrosas". Já experimentei o vinho deste lado do oceano e amei, muito bom!
Posso dizer que também adoro um café gelado com sorvete de creme e chantilly (vanilla), mas não resisto aos sucos geladinhos ou água de coco, pena que não moro na praia! risos...
Um beijo e quero experimentar todas essas coisas que me disse!
Gabi.
Mas na minha concepção cult, meio intelectual de esquerda, era um bar muito limpinho... e estava dentro de um shopping. Tomara que volte mais sujinho.
Dei uma sorte danada esbarrando neste teu blog. Acabo de dar uma navegada por ele e já virei fã. Parabéns.
Achei demais a tua crônica (assim como do Prata também - magnífica), não apenas pela ótima narrativa, mas também por eu ser, assim como você, um frequentador assíduo do Zin'. Gostava tanto daquele ambiente gostoso que na última semana de funcionamento bati cartão todas as noites! rs E ainda fiz uma singela homenagem no meu humilde blog (http://sacovazionaoficaempe.blogspot.com/2008/12/fome-e-sede.html). Ah, não podia deixar passar em branco, não!
Aproveito a oportunidade pra saber se você já sabe quando o Zin vai reinaugurar (perdi o n° do Sérgio).
Imagine o tamanho da ansiedade!
Abraço
Esta crônica do Prata realmente é excelente. Agora vamos ver o jeito que o Zin'Bar volta... rs
Um beijo e muito obrigada pela visita e comentário!
Gabi.
Fiquei lisonjeada com os elogios, obrigada! O Antônio Prata é um dos meus favoritos...
Ah! Se você conhece o Zin'Bar você tem ideia da falta que ele faz! Nos últimos dias eu também tentei bater cartão ao máximo já sabendo a saudades que ele ia me deixar! risos...
Aliás, vou até ligar para minha amiga perguntando se ela sabe, ela conhece o Sérgio também. Assim que souber lhe aviso sobre o esperado dia!
Um beijo e mais uma vez obrigada (pela visita, elogio e comentário),
Gabi.